Indonésia tem plano de 35 bilhões de dólares para mudar a capital
- Carolina Bottino
- 30 de mai.
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Atualizado: 2 de jun.

Com a promessa de ser totalmente auto sustentável, apenas com carros elétricos e emissões zeradas até a conclusão das obras, Nusantara é a nova capital da Indonésia. A cidade substitui Jacarta desde agosto do ano passado, quando foi inaugurada pelo ex-presidente Joko Widodo, principal incentivador da mudança. Com 281 milhões de habitantes, a maior economia do Sudeste Asiático tem um projeto ambicioso de construir uma nova capital motivado pelas mudanças climáticas. No entanto, por estar localizada em uma região de selva, os impactos ambientais preocupam especialistas. Para Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro, coordenador do Observatório das Metrópoles, a pressão sobre os recursos naturais pode gerar conflitos entre população e meio ambiente, o que replica os problemas encontrados em Jacarta, que é propensa a inundações.
Nusantara fica em Calimantã, na Ilha de Bornéu, uma área sem riscos de desastres naturais, no centro da Indonésia, a 1700 km de distância da antiga capital. A mudança, anunciada em 2019, é motivada devido aos problemas ambientais de Jacarta, que está 40% abaixo do nível do mar e afunda 7,5 cm a cada ano, um dos ritmos mais acelerados do planeta. A população local - cerca de 10 milhões de habitantes - frequentemente enfrenta dificuldades devido às consequências das enchentes, como perder as casas e ter de evacuar para um local seguro.
O coordenador do Observatório das Metrópoles e também doutor em Arquitetura e Urbanismo afirmou que o planejamento é essencial na construção da nova capital, e usar casos de sucesso de outras cidades, como Singapura, pode ser a chave para o sucesso de Nusantara.
– Singapura demonstrou que um planejamento urbano multidisciplinar e baseado em dados pode transformar limitações geográficas em oportunidades. Seus princípios de sustentabilidade, inclusão e eficiência são inspiração para cidades como Nusantara, e mostram que pode ser possível evitar os erros de crescimento desordenado que ocorrem em Jacarta – revelou Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro.
Investimento bilionário
Para a mudança, cerca de US$ 35 bi foram investidos na nova capital, com 20% de investimento público e o restante privado - com a China sendo a maior parceira. A população se preocupa que o valor seja gasto em uma ideia que pode não ser finalizada.
Agung Wicaksono, vice-chefe de planejamento e investimento da nova capital, afirmou que investidores estrangeiros estariam em fase de negociação, o que envolveria estudos sobre a viabilidade das construções. Uma das propostas é a parceria entre governo e investidores, com o compartilhamento de risco do projeto. Ele revelou que os interessados querem ter certeza de que a infraestrutura está finalizada para que a população local se torne um mercado para eles.
Joko Widodo, ex-presidente que propôs a mudança, deixou o cargo em outubro, após 10 anos anos chefiando o país. O novo líder, Prabowo Subianto, afirma que continuará o projeto e vê a cidade funcionando em cinco anos. Apesar dele já trabalhar em Nusantara, a estimativa é que ela só funcione totalmente em 2040 - com a promessa de ter as emissões reduzidas.
Para Eka Permanasari, professora de Design Urbano da Monash University, na Indonésia, o financiamento privado para um projeto grandioso como Nusantara é fundamental.
– Os investidores precisam ver retorno e viabilidade no projeto, com desenvolvimento constante. É assustador o quanto dependemos da iniciativa, privada, quase 80%, porque com essa quantia você não pode parar no meio do caminho. Mesmo assim, devido aos problemas da ilha de Java (onde fica Jacarta), existe também o lado positivo da nova capital, principalmente em relação ao desenvolvimento.
Ao Parlamento, o ex-ministro de Planejamento Suharso Monoarfa revelou que a nova capital tem um papel central e é “um símbolo da identidade da nação, se tornando o novo centro de gravidade econômica do país".
O projeto tem cinco fases. A primeira seria finalizada com a inauguração da cidade, em agosto o ano passado, mas acabou adiada. Mesmo assim, o gerente de infraestrutura de Nusantara, Danis Sumadilaga, garantiu que 90% da fase 1 já foi concluída.
– Isso faz parte do desenvolvimento, estamos começando algo para o futuro do país
– afirmou em entrevista à BBC Indonésia às vésperas da inauguração.
Apesar dos atrasos, funcionários públicos precisaram se mudar para a nova capital - que ainda não possui infraestrutura suficiente. Cerca de 10 mil servidores do governo estavam previstos para se mudar em outubro do ano passado. Os solteiros têm o receio de precisarem dividir apartamento com desconhecidos, já que os prédios construídos têm apenas apartamentos de três quartos. No caso dos casados, a preocupação é de que não haja infraestrutura como escola e serviços essenciais para as famílias.
Nusantara: uma capital sustentável?
Com a promessa de sustentabilidade que mistura natureza e metrópole, a proposta é que Nusantara funcione apenas por meio de fontes de energia renovável, além de contar com gerenciamento de resíduos e permitir apenas o uso de carros elétricos. O objetivo é que até sua conclusão, em 2045, as emissões sejam zeradas, atingindo a meta nacional de redução de carbono da Indonésia 15 anos antes do prometido.
Quanto à sustentabilidade durante o período de construção da cidade, populações indígenas se preocupam. Algumas delas receberam a promessa de serem realocadas para outras regiões, já que suas antigas residências seriam transformadas para a nova capital, mas temem que sejam promessas vazias. Além disso, a expansão de Nusantara pode degradar o habitat de espécies em extinção.
Como resposta, o governo declarou que a cidade é construída em terras que antes faziam parte de plantações de monocultura de eucalipto, que com o tempo degradaria o meio ambiente.
Futuro da nova capital
Ainda que tenha sido inaugurada e tenha autorização para ser a nova sede administrativa, um decreto presidencial precisa ser adotado para que a cidade seja oficialmente reconhecida como capital. A decisão depende da infraestrutura, como água e eletricidade, e das obras estarem concluídas.
Mesmo com todas as dificuldades, o ex-presidente Widodo acreditou tanto na ideia de construir uma nova capital que, para atrair investidores, prometeu dar a eles direitos sobre a terra por 190 anos. No entanto, apesar de ambiciosa, a proposta de construir uma capital do zero sem garantia nenhuma do fim da construção afastou não só o interesse em financeiro, mas também em fechar acordos internacionais. Em 2023, Widodo apresentou Nusantara aos líderes mundiais na cúpula do G20, que ocorreu na Índia, mas saiu de lá sem nenhum acordo assinado relacionado à nova capital.
Agora resta saber se a nova gestão do general aposentado Prabowo Subianto irá sustentar o peso de finalizar as obras em Nusantara e fazê-la ser funcional para a população da Indonésia. Até agora, além da mudança dos funcionários públicos, o governo não apresentou nenhuma proposta de incentivo aos cidadãos indonésios para que futuramente se mudem para a nova capital. Sem esse planejamento, uma tendência é Jacarta permanecer sobrecarregada enquanto Nusantara cumpre apenas a função de sede do governo.
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